Por Ana Beatriz Novaes
Teu ar condicionado ao tempo prendia-te numa rotina miserável: trabalhar, ganhar dinheiro, fazer comida, levar as crianças pro colégio, pegar o ônibus lotado, lotar-se de compromissos, lotar-se de qualquer coisa, de alguma coisa.
E comprimida dentro do ônibus, tomava comprimido anti-stress, que te prendia numa calma fria e amarga que tanto tentas, em vão, esconder de tuas crianças.
Com o cabelo preso no alto para não ter trabalho com ele, tu te prendeste ao chão, evitando sempre o alto. Pra que, mulher?
Na comida, sabor não tinha. Era tua comida, mulher, ensinada pela mãe que há muito se fora, então por que achas tão ruim?
Eu, que de longe te observo, vejo uma mulher mais feminina, mais mulher, que faminta está dentro de ti, mulher, com saudade de vestidos e querendo dançar mambo. Tem uma mulher querendo ser mulher, longe do ar-condicionado, do ônibus lotado, do comprimido ingerido, do sapato de salto. Tem uma mulher que você nem conhece, mulher.