João Paulo chegou do
escritório depois de um longo dia de trabalho e foi para a faculdade. Luan, que
pouco fazia da vida, estava cansado de procurar emprego. Eleonora estava
triste, amargurada com a morte do pai; chegou em casa e foi cuidar do almoço
para o dia seguinte. Ricardo estava preocupado com o vestibular, preocupado com
a entrevista de emprego do dia seguinte, preocupado com essas coisas que os
meninos quase homens geralmente se preocupam. Cecília chegou cansada em casa,
depois de um longo dia de trabalho e estudo, pensando nas provas, na família,
no amor que ardia e queimava em seu peito... Cecília era uma moça comum, tão
comum quanto os outros citados acima, mas vamos, vejamos a história de Cecília.
Cecília era uma moça que
havia sido obrigada a se tornar mulher muito cedo. Seu pai havia morrido quando
ela tinha apenas treze anos, e assim que teve idade para isso, começou a
trabalhar para ajudar sua mãe. Cuidava de casa, pagava algumas contas, ajudava
na educação do irmão mais novo, já era mulher feita. O problema é que mulheres
e homens feitos acabam por se esquecer de sonhar, seja por conformismo ou falta
de esperança, ou falta de tempo e dinheiro.
A família de Cecília, como
você pode notar, não tinha dinheiro. Tempo? O tempo da coitada era divido em
trabalhar, ir a escola, cuidar de casa e estudar. Esperança? Cecília era pé no
chão, outra coisa que veio com sua “adultisse”, sabia que os vestibulares eram
concorridos e que não poderia pagar uma faculdade particular. Mas ainda assim,
com todos esses problemas, Cecília não se conformava.
Chegou em casa para uma
noite comum em que fazia comida, ajudava na tarefa do irmão e estudava para
alguma coisa do colégio, mas deparou-se com crianças brincando na rua. As via
ali todos os dias, principalmente agora, que haviam “descoberto” as alegrias de
um carrinho de rolimã, e sempre sorria. Não lembrava muito da última vez que
parou para brincar.
– Ceci, vem descer a ladeira
com a gente! – gritou um que concertava um carrinho. Cecília olhou. Olhou para
seus braços, carregados de livros; olhou para sua casa, onde sua mãe estaria à
sua espera; olhou, contudo, para dentro de si, e sabia que não poderia resistir
a tal chamado.
Cecília caros leitores,
desceu a ladeira naquele carrinho de rolimã. Um pouco de medo pairava em seu
coração, aquele medo que a gente adquire quando deixa de brincar, mas foi
justamente esse medo que tudo ficar mais incrível. Era uma menina de 18 anos,
já mulher feita, que tinha prova de Química no dia seguinte, largando tudo para
descer uma ladeira sentada num pedaço de madeira que a levou para muito além da
esquina – levou-a para um mundo juvenil, um mundo que a fazia ainda ter
esperança nessa vida, um mundo esquecido pelos adultos e desconhecido por
muitas crianças do nosso Brasil.
Cecília desceu no carrinho
de rolimã, e chorou, e se lavou, e foi feliz. Dia seguinte, era o mesmo
colégio, o mesmo trabalho; era a prova, era o irmão, era o dia seguinte, mas as
pessoas que saboreiam, nem que seja um resquício só, de juventude quando essa
foi engavetada, não são mais as mesmas. Podem até ser novamente sufocadas pela
rotina, podem até acabar se esquecendo outra vez do mundo juvenil, mas o mundo
juvenil nunca as esquece, o mundo juvenil nunca as deixa.
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